Luiz Flávio Gomes e Áurea Maria Ferraz de Sousa - 23/08/2011 - 10h17
É da competência do Tribunal do Júri a conclusão se o fato se deu
mediante culpa consciente ou dolo eventual. Este foi o posicionamento
que fundamentou a negativa do pedido de habeas corpus 199.100-SP,
julgado no dia 04 de agosto de 2011, pela 5ª Turma do STJ (Superior
Tribunal de Justiça), sob a relatoria do ministro Jorge Mussi.
De acordo com a conclusão do Tribunal da Cidadania, a competência que a
Constituição Federal atribuiu ao Tribunal do Júri garante que a
avaliação aprofundada das provas seja feita em plenário. Por esta razão,
a conclusão de que se houve por parte do acusado culpa consciente ou
dolo eventual há de ser feita pelo Júri.
O paciente do writ foi pronunciado por ter causado a morte da vítima
porque, supostamente, estando embriagado, dirigia em alta velocidade
tendo se envolvido em acidente fatal.
Como se sabe, a pronúncia é a decisão que leva o acusado a julgamento
perante o Júri, tendo o juiz se convencido da materialidade do fato e da
existência de indícios suficientes de autoria ou de participação (art.
413, CPP). E para que o fato seja julgado pelo Tribunal do Júri é
necessário que o crime seja doloso contra a vida (art. 5º, inc. XXXVIII,
CF/88).
No caso em apreço, a defesa alegava que o fato não foi cometido dolosamente, mas mediante culpa.
Aí está a razão em se falar em culpa (talvez consciente) ou dolo
eventual na hipótese: o motorista que conduz seu veículo em alta
velocidade e embriagado prevê e aceita o resultado matar alguém? Ou ele
sequer previu o resultado?
Vulgarmente diz-se que a distinção entre a culpa consciente e o dolo
eventual está nas expressões: “danou-se” e “que se lixe”,
respectivamente. Na prática, no entanto, a questão não é de simples
conclusão, principalmente quando se trata de prova: como provar qual o
verdadeiro estado anímico do condutor?
Por esta razão é que acertado foi o posicionamento do STJ, acompanhando
o TJ-SP, no sentido de que a valoração ampla das provas há de ser feita
pelo Júri, ainda que com isso o parquet tenha que imputar o dolo
eventual.
Quando, de forma inequívoca, não há como vislumbrar qualquer indício de
dolo eventual, será o caso de se retirar a competência do Tribunal do
Júri, desde logo.
STJ mantém decisão que leva motorista a Júri popular por acidente fatal
A 5ª Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) manteve a pronúncia de
um motorista supostamente embriagado que dirigiu em alta velocidade e
se envolveu em acidente um fatal. Para os ministros, cabe ao Júri deve
avaliar se houve culpa consciente ou dolo eventual.
Para o relator, ministro Jorge Mussi, essa complexidade não seria
possível de ser resolvida pelo STJ em habeas corpus. Ele afirmou que o
julgamento da ocorrência de dolo eventual ou culpa consciente deve ficar
a cargo do júri, que é constitucionalmente competente para julgar os
crimes dolosos contra a vida.
Segundo a defesa, o motorista teria colidido com o veículo da vítima
somente depois que um terceiro carro o atingiu na traseira, e sendo
assim as provas não demonstrariam a ocorrência de dolo eventual. No
habeas corpus a defesa sustentou que o fato de o motorista estar
embriagado no momento do acidente não poderia afastar a análise de sua
conduta e culpa e do nexo de causalidade entre os fatos, sob pena de
ocorrer responsabilização objetiva.
Segundo o TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), apesar de as
testemunhas que se encontravam no veículo do réu terem apoiado a tese da
defesa, as demais divergiram. Sendo assim, o TJ-SP pronunciou o réu.
O ministro Jorge Mussi concordou com o TJ-SP. Segundo seu voto, a
pronúncia enquadrou o caso em dolo eventual, com submissão ao Tribunal
do Júri, em razão do suposto estado de embriaguez e do excesso de
velocidade, o que está de acordo com a jurisprudência do STJ.
Na avaliação do relator, seria necessário analisar profundamente as
provas para diferenciar o dolo eventual apontado pelo TJ-SP da culpa
consciente sustentada pela defesa. O STJ não reexamina provas.
A diferença entre os dois institutos foi explicada pelo ministro com
citação do doutrinador Guilherme Nucci: “Trata-se de distinção
teoricamente plausível, embora, na prática, seja muito complexa e
difícil. Em ambas as situações o agente tem a previsão do resultado que
sua conduta pode causar, embora na culpa consciente não o admita como
possível e, no dolo eventual, admita a possibilidade de se concretizar,
sendo-lhe indiferente.” A decisão foi unânime.
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