sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Decisão do STJ sobre detenção de adolescente ajuda o crime, diz chefe da Polícia Civil

AFONSO BENITES DE SÃO PAULO

O chefe da Polícia Civil paulista, delegado Marcos Carneiro Lima, criticou ontem a súmula do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que determina a não internação de adolescente detido por tráfico de drogas que não seja reincidente, não tenha usado violência ou grave ameaça e não tenha descumprido uma medida socioeducativa.

Para ele, a decisão, publicada na quinta-feira, é “estímulo a quem comete crime”. A súmula vai balizar as decisões de juízes da Infância e deve reduzir o número de internados em unidades como a Fundação Casa, em São Paulo, onde 42,7% estão por tráfico de drogas.
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Folha – Como a súmula influencia o trabalho da polícia? Marcos Carneiro Lima – Na esfera policial, continuamos na mesma dinâmica, combatendo o tráfico. Agora, quando chegar à esfera judicial, vai acabar estimulando o traficante a arregimentar mais adolescentes para o crime.
No domingo, o colunista da Folha Ferreira Gullar escreveu artigo ressaltando que a sociedade fica envergonhada de punir. Concordo. Porque tem de haver punição.

O senhor acha que essa súmula é negativa para a polícia? Sim. Ela é um estímulo para quem comete crime.

Qual é o percentual de jovens em um grupo de traficantes? Não existe dado preciso sobre isso. Mas, na maioria dos casos, há vários adolescentes para assumir a responsabilidade porque a punição para eles é mais branda. Assumem crimes que não cometeram, como o de chefiar o bando. Isso acontece principalmente nas biqueiras, onde se vende a droga.

Muda o trabalho da polícia? Não. Teremos mais trabalho, mas agiremos da mesma forma. Se houver adolescente infrator, vamos levá-lo à Justiça e caberá ao juiz decidir.
O importante é que a polícia não esmoreça. Só pelo fato de levar o menor até a delegacia, chamar os pais e mostrar que ele está envolvido em atividade criminosa, a polícia já cumpre seu papel.
Se depois houver o abrandamento, isso vai fazer com que mais jovens pratiquem crimes. Pode até haver um aumento da criminalidade.

Essa questão não é maior do que a discussão policial? Exatamente. É preciso discutir a questão social. Quem não tem nenhuma opção acaba indo para a criminalidade, para o tráfico. O Estado precisa dar mais oportunidades.


Tráfico não liga para destino de jovem, afirma procurador

Membro da comissão que elaborou o Estatuto da Criança e do Adolescente, o procurador de Justiça Paulo Afonso Garrido de Paula afirma que atribuir um eventual aumento da criminalidade a não internação de jovens é uma "grande besteira".



Uma súmula do STJ (Superior Tribunal de Justiça) determina a não internação de adolescente detido por tráfico de drogas que não seja reincidente, não tenha usado violência ou grave ameaça e não tenha descumprido uma medida socioeducativa.

"O criminoso está pouco preocupado se o seu 'soldado do tráfico' vai ser preso ou internado. Para ele tanto faz", afirmou.

Em entrevista à Folha, ele elogiou a súmula do Superior Tribunal de Justiça que estabeleceu que o jovem pego praticando tráfico de drogas pela primeira vez não deverá, obrigatoriamente, ser apreendido em uma unidade de internação.

De Paula diz, no entanto, que é preciso endurecer a pena contra quem corrompe os jovens. "Já disseram que essa súmula é uma tragédia. Mas tragédia é encarcerar uma vítima. Tragédia é não cuidar da infância", afirmou.

Para o juiz Egberto Penido, que atua na Vara da Infância e Juventude de São Paulo, a súmula do STJ ratifica o que já havia ocorrendo na capital paulista. "Nos últimos três anos já tínhamos, na cidade, esse entendimento", disse.

Nessa semana, esse magistrado já havia analisado o caso de um jovem que foi detido por tráfico pela primeira vez. Em sua decisão, Penido determinou que ele cumprisse liberdade assistida e que tratasse de seu vício em droga em um ambulatório.

Se descumprir a decisão, o jovem será encaminhado para uma unidade de internação na Fundação Casa.

BALANÇA QUEBRADA
 
Para o promotor Thales de Oliveira, que atua na área da Infância e Juventude em São Paulo, a súmula do STJ só reforça a atual legislação que, na sua opinião, não protege o adolescente como deveria.

"Se um jovem for pego cometendo direção perigosa vai, em tese, receber a medida de liberdade assistida. O mesmo vai ocorrer para o tráfico. A Justiça dá o mesmo peso para atos infracionais completamente distintos."

Oliveira diz que ao não internar o jovem acusado de tráfico a Justiça passa uma mensagem de que essa conduta não é grave.

"Qualquer pai vai graduar o castigo do filho de acordo com a arte que ele fez. Se o tráfico não for punido como deveria, como o adolescente vai entender a gravidade de seu ato?", questionou.

No caso de impossibilidade de internação, os juízes deverão determinar outras medidas, como a prestação de serviços comunitários.

"Uma saída é mandar esse jovem trabalhar em clínicas de tratamento de usuários de drogas", afirmou o desembargador Antonio Carlos Malheiros, da área da Infância e Juventude do Tribunal de Justiça paulista.

(AFONSO BENITES)

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